quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Aquarela

Numa folha qualquer
Eu desenho um sol amarelo
E com cinco ou seis retas
É fácil fazer um castelo...

Corro o lápis em torno
Da mão e me dou uma luva
E se faço chover
Com dois riscos
Tenho um guarda-chuva...

Se um pinguinho de tinta
Cai num pedacinho
Azul do papel
Num instante imagino
Uma linda gaivota
A voar no céu...

Vai voando
Contornando a imensa
Curva Norte e Sul
Vou com ela
Viajando Havaí
Pequim ou Istambul
Pinto um barco a vela
Branco navegando
É tanto céu e mar
Num beijo azul...

Entre as nuvens
Vem surgindo um lindo
Avião rosa e grená
Tudo em volta colorindo
Com suas luzes a piscar...

Basta imaginar e ele está
Partindo, sereno e lindo
Se a gente quiser
Ele vai pousar...

Numa folha qualquer
Eu desenho um navio
De partida
Com alguns bons amigos
Bebendo de bem com a vida...

De uma América a outra
Eu consigo passar num segundo
Giro um simples compasso
E num círculo eu faço o mundo...

Um menino caminha
E caminhando chega no muro
E ali logo em frente
A esperar pela gente
O futuro está...

E o futuro é uma astronave
Que tentamos pilotar
Não tem tempo, nem piedade
Nem tem hora de chegar
Sem pedir licença
Muda a nossa vida
E depois convida
A rir ou chorar...

Nessa estrada não nos cabe
Conhecer ou ver o que virá
O fim dela ninguém sabe
Bem ao certo onde vai dar
Vamos todos
Numa linda passarela
De uma aquarela
Que um dia enfim
Descolorirá...

Numa folha qualquer
Eu desenho um sol amarelo
(Que descolorirá!)
E com cinco ou seis retas
É fácil fazer um castelo
(Que descolorirá!)
Giro um simples compasso
Num círculo eu faço
O mundo
(Que descolorirá!)...

Toquinho, M. Fabrizio, G. Morra, Vinicius de Moraes, 1983


quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Luto

É de negro que veste a minha alma e salgadas são as lágrimas que inundam esta noite o meu rosto. Choro por ti, mas choro ainda mais por mim, que sofro pelo afastamento que nos impus.

Se soubesses como me custou fazê-lo, como foi difícil para mim tomar esta decisão... se imaginasses a angústia que sinto quando penso que não te vou ver nem falar contigo, que não saberei nada de ti... que as nossas vidas continuarão sem se encontrarem... Ou talvez saibas... talvez também o sintas.

Pensar que já não vou partilhar contigo nenhum dos episódios do meu dia-a-dia, que já não vou comentar os teus jogos e os golos que marcaste, que já não vamos simplesmente falar... aterroriza-me, mas dá-me também esperança. Esperança de que esta seja a solução que tanto procuro para mim.

Quero voltar a sorrir! Quero voltar a ouvir música com a mesma alegria que antes me fazia elevar o som do rádio e começar a cantar! Quero dançar, dançar até os meus pés ficarem cansados! Quero refilar, refilar até que já ninguém me possa ouvir! Quero voltar a ser a pessoa que um dia te despertou a atenção...

Não sei quanto tempo durará o meu luto, mas sei que durará o tempo que eu precisar para aceitar e ultrapassar tudo o que nos aconteceu. Sei que passará quando deixar de questionar o porquê de tudo isto e me resignar simplesmente aos desígnios da vida. Passará inevitavelmente no dia em que reconhecer que há coisas que são do domínio da emoção e que a razão simplesmente desconhece...
Só espero que seja breve... porque sei que quero voltar a estar contigo...